P E R S P E C T I V A S

Para uma crítica do Conhecimento nas sociedades pós-modernas

30.3.06

Políticas e objectivos de actuação nas reformas do espaço urbano moderno

«Hoje em dia, a questão urbana tende a perfilar-se como
uma nova face da questão social destacada da questão operária,
como espaço das mutações mais sensíveis das políticas públicas e
como apelo a uma sociabilidade perdida. O mundo das periferias
não é redutível nem ao ghetto, nem ao das comunidades,
nem mesmo ao da dependência económica e social, articula
lógicas de acção próprias que podem indicar dimensões
essenciais de uma cultura popular heterogénea e frágil.»

François Dubet, Les Figures de la Ville et de la Banlieue



O que faz, então, com que uma cidade seja uma boa cidade? É óbvio que pode parecer uma questão sem sentido. As cidades são demasiado complicadas, escapam em demasia ao nosso controlo, e afectam demasiadas variações culturais, para permitirem uma resposta racional.

As cidades, tal como os continentes, são simplesmente enormes factos da natureza, aos quais temos de nos adaptar. Uma pessoa pode afirmar «gosto de Lisboa», mas todos sabemos que é simplesmente uma preferência trivial, baseada na experiência pessoal.

Mesmo os académicos e estudiosos do tema procuram acima de tudo dados e números, factos compreensíveis pela metodologia científica regulamentada, e muitas vezes esquecem a realidade dos fenómenos que são vividos por milhões de pessoas no espaço urbano.

Em Metapolis, o autor procura de alguma forma desmistificar as metrópoles do passado, mistificando as do presente e as do futuro, sem contudo propôr uma clara previsão do amanhã. A verdade é que tudo é incerto, e não há certezas absolutas de nada. Por isso, como estabelecer regras normativas específicas para uma realidade instável, em constante mutação, diferente e dinâmica no tempo e no espaço, nos edifícios, e nas pessoas? Não creio que Ascher satisfaça completamente esta urgência de respostas.

A cidade como lugar de realização humana, acima de tudo, como centralidade simbólica, parece uma fórmula do passado. É neste sentido que muitas das políticas urbanas, no momento presente, estão mais preocupadas com a qualificação plurifacetada do espaço urbano, ou mais concretamente, com o fazer cidade por toda a cidade. Indo mais longe, e a acentuar-se esta dicotomia, muitos questionam mesmo a própria cidade e os seus limites e, no extremo, a própria pertinência do termo. A questão é a de estarmos perante uma cidade ou várias cidades, ou perante nenhuma cidade.

Criar bons espaços públicos não significa reproduzir os antigos, ainda que com estes muito se possa aprender. Mais do que reunir todos os requisitos qualitativos para a sua espacialidade ou de que conseguir as «coisas» físicas que se desejam. Criar o espaço público é assimilar o mistério que envolve os seus múltiplos propósitos sociais, através de um desenho que caminhe de encontro aos objectivos públicos e das comunidades a (re) criar.

Assumindo que a vida pública está pujante na cidade contemporânea industrializada, o uso do espaço público constitui uma das medidas actuais mais importante para o seu êxito, se entendermos que a popularidade de um lugar em muito depende da relação entre a localização, desenho e pormenor, uso e significado. Por outras palavras, da construção do seu genius loci, onde lugar está longe de se confundir com o espaço físico residual ou a implantação do edificado, por vezes desprovido de significado, histórico, económico ético, social, psicológico, etc., que o qualificam a par da mudança, rumo a uma proposta pelos padrões de vida emergentes e pela nova arquitectura da cidade.

O espaço urbano, mais do que um suporte físico específico, representa uma modalidade de composição entre actividades e grupos, simultaneamente indutor e induzido, como exprimem as relações existentes entre a morfologia dos espaços e os aspectos sócio-económicos e afectivos da vida social. Por isso, julgo que quaisquer recomendações baseadas na investigação do espaço público urbano não podem substituir a participação pública directa para se proceder a eventuais acertos. Como diz Ascher: «para gerir um sistema mais complexo, é necessário operacionalizar uma organização menos vertical e mais descentralizada e, ao mesmo tempo, reforçar e tornar mais eficazes os instrumentos centralizados
[1]».

Como dizia Robert M. Pirsig em 1974: «se formos a reformar o mundo e transformá-lo num lugar melhor para viver, o ideal é não falar sobre relações de natureza politica, que são indubitavelmente dualísticas, cheias de sujeitos e objectos e suas relações recíprocas; ou com programas cheios de coisa para outras pessoas fazerem. Os valores sociais só serão correctos se também o forem os individuais. O lugar para melhorarmos o mundo começa em nossos corações e em nossas mãos, e depois, é trabalhar lá fora, a partir daí. Outros querem falar sobre como ampliar o destino da humanidade. Eu quero falar apenas sobre como consertar uma motocicleta. Creio que o tenho a dizer tem um valor mais douradoro.»

[1] O autor advoga a existência de uma governância metapolitana para que se possa alcançar este objectivo. No entanto, sobressai também no seu discurso algum pessimismo quando refere que para que a metapole se realize, é necessário minimizar disfunionalidades e limitar prejuízos.

O movimento perpétuo, o contacto incessante e a solidão encoberta

Na metrópole contemporânea, as pessoas demonstram uma extrema dificuldade em desenvolver afectividade e laços com os lugares que estão para além da própria casa. Isso tem implicações na falta de afeição, identidade e compromisso das pessoas na sua relação com a metrópole. É o que Ascher quer dizer quando refere a existência de estrangeiros entre estrangeiros, a aprender a viver juntos e simultaneamente sozinhos nas grandes metrópoles.

Esses próprios espaços são recompostos continuamente, dando-lhes novos contornos, fazendo advir novas configurações, o que definitivamente põe a cidade numa encruzilhada complexa com o urbano. Portanto, o citadino tem na cidade um quadro estável de integração, de segurança espacial e ontológica, e o futuro não é percepcionado nem sentido como uma expressão e imagem de angústia e de catástrofe. O homem da cidade vive pois intensamente, num universo de filiações comunitárias muito fortes, pautado por relações de sociabilidade e de solidariedade intensas, situação completamente diferente da vivenciada com a crescente implantação do processo de urbanização
[1].

A cidade apresenta-se sempre à observação imediata enquanto um reagrupamento de populações e actividades duravelmente estabilizadas sobre um território restrito. A proximidade física permite aos seres sociais entrar em relação, e favorece o desenvolvimento de novas relações. Na medida em que concentra num mesmo lugar um grande número destes processos cumulativos. É talvez por isso que por vezes acreditamos poder definir a cidade como o dispositivo mais apropriado às diversas relações de troca e de cooperação que se instauram entre os homens, e é em todo o caso no meio urbano por excelência que se estabelecem, se amplificam e desmultiplicam as interacções de todas as ordens que constituem o princípio da vida social.

Por tudo isto, não deixa de ser simultaneamente irónico e interessante pensarmos que no meio de tanta gente, engolidos por multidões em recintos públicos e privados, entre milhares de indivíduos diferentes e simultaneamente iguais, deixamos que toda a riqueza que esse número de pessoas e que essa diversidade propicia quer em termos de conhecimento mútuo, troca de informações e de situação estratégica para acções de solidariedade, deixamos todas estas possibilidades ao abandono por vias do anonimato, da indiferença forçada, e da própria anomia social. E desta forma, entre milhares de pessoas, sentados no meio do nosso ouro, morremos de fome, Midas eternos.

[1] Aliás, Jean Rémy e Lilianne Voyé, explicitam esse modo de estar quando referem que «se a industrialização pode (…) engendrar sentimentos de insegurança e fazer ler a rua como espaço perigoso, ela contribuiu também para multiplicar as situações de isolamento e de solidão, dissolvendo as filiações comunitárias que permitiram outrora a cada um contar com os outros.»

24.3.06

O processo de transicção de uma economia recolectora para uma economia de produção de bens de subsistência

A evolução da sociedade recolectora é muito lenta e a transição para a economia agrícola e pastorícia processou-se em épocas e regiões muito distintas, ao longo de milénios, mas sempre sob formas semelhantes na sua evolução. O homem aprendeu a manufacturar e utilizar ferramentas eficazes e diversos tipos de utensílios, como é o caso dos recipientes, que satisfaziam as necessidades do dia a dia, tão perfeitamente que até hoje algumas das suas formas pouco necessitaram de ser melhoradas. Esses instrumentos permitiram aos produtores dominarem as condições ambientais e desenvolverem novas tradições tecnológicas e culturais.
A obtenção de produtos alimentares deixou de constituir o objectivo quase exclusivo e criou condições propícias ao desenvolvimento de actividades criativas. Nasceu o pensamento abstracto e a noção de estética. A espécie humana interroga-se acerca da natureza, apercebe-se de numerosas leis e relações entre os fenómenos naturais e passa a procurar intervir nesses fenómenos. Muitas actividades criativas coincidem com o aparecimento do ser humano denominado por antropólogos e historiadores de “homo sapiens sapiens”.
As consequências da transição para o modo de produção alimentar sentiram-se na expansão da área ocupada pelas comunidades agro-pecuárias, na migração de grupos populacionais e a sua fixação em locais apropriados ao exercício das suas novas actividades produtivas, o que tem a ver com a existência de prados ou terras férteis ambientes climáticos e geográficos propícios.
Porém, a agricultura não se revelou de imediato como um sistema de fácil difusão. Muitos grupos recolectores tinham conhecimentos suficientes para passarem à fase da produção de alimentos, mas não o fizeram e mantiveram os seus métodos de subsistência tradicionais, mesmo vivendo em estreito contacto com povos agrícolas. O estilo de vida de caça e recolecção, apoiado pela manufactura de utensílios de pedra, não cessou abruptamente, mas sim terá muitas vezes continuado em áreas adjacentes às ocupadas por povos agricultores.
Este comportamento verificou-se sobretudo entre grupos fixados em:
- áreas impróprias para a criação de plantas e animais, onde as condições climáticas, geográficas ou ambientais se revelaram desfavoráveis;
- inversamente, áreas com situações tão favoráveis que punham em causas as vantagens do pastoreio e da agricultura;
- zonas próximas do mar, dos rios ou dos lagos, de pesca abundante;
- localizações com características muito específicas que dificultaram a transição.
Em certas regiões do globo mantiveram-se grupos de caçadores recolectores em áreas inadequadas para a criação de gado e agricultura, vivendo em simbiose com os camponeses das regiões vizinhas. Algumas destas populações perpetuaram os seus costumes ancestrais até aos dias de hoje.
Em regiões tropicais, com escassa população humana, ricas em produtos alimentares, as populações não se sentiram motivadas para alterar a tradição da caça e da simples recolha dos frutos da terra. Com uma vegetação luxuriante, as pessoas escavam a terra e dela tiram um tubérculo, apanham um cacho de bananas de uma árvore, que se multiplica naturalmente, sobem a uma palmeira para pegar um coco, cujo leite bebem e cuja polpa comem. A riqueza do bioma em áreas naturais é tal que põe em causa as vantagens do pastoreio e da agricultura. A caça e a recoleccção proporcionam aí um nível elevado de nutrição com menor dispêndio de tempo e de esforço físico. Esta forma de vida perpetuou-se, em algumas regiões, com poucas mudanças, até tempos muito recentes.
Em ambientes marítimos, lacustres ou fluviais, onde a alimentação assentava na pesca, apanha de mariscos ou da caça a mamíferos aquáticos, os povos mantinham os seus métodos ancestrais e permutavam os seus produtos com as comunidades que já se dedicavam à agricultura ou criação de gado.
São inúmeros os exemplos de recolectores a viverem em estreito contacto com povos agricultores sem adopção da agricultura. Alguns grupos de recolectores, ocupando ainda regiões extremamente vastas, encontravam-se tão bem integrados no seu ambiente natural, que ainda não sentiam a necessidade de se adaptar ao modo de produção alimentar, nem a necessidade de armazenar alimentos além dos de consumo imediato ou durante as estações do ano.
Tribos houve que abandonaram a actividade exclusivamente agrícola e decidiram-se por métodos alternativos para a sua subsistência e outras conservaram o modo de vida nómada, dedicando-se de forma preponderante à criação de animais. Nas estepes a transição para a criação permanente de gado dava os primeiros passos.
Continuaram a existir espaços isolados, verdadeiras ilhas de caçadores e recolectores, que sobreviveram às mudanças e permaneceram em zonas caracterizadas por uma grande concentração de vida selvagem, onde não havia necessidade de recorrer à agricultura para garantir a subsistência.
A barreira do deserto do Sara constituiu um obstáculo à passagem das populações numa altura em que começava a desenvolver-se uma agricultura sedentária na África do Norte. A dificuldade no estabelecimento de contactos humanos viria a influenciar o curso da evolução na África Subsariana, onde o estilo de vida baseado na caça e na recolecção permaneceu bastante imutável até à chegada de povos produtores de alimentos já nos séculos próximos do início da era cristã. Além disso, a riqueza dos recursos alimentares das regiões de savana associada à escassa população não estimularam o cultivo de plantas ou a criação de gado. As formas de vida baseadas na caça e na recolecção perpetuaram-se, com ligeiras mudanças até tempos muito recentes. Em algumas regiões surge a prática duma economia mista em que, a par de um tipo muito rudimentar de produção alimentar, aparece a produção de artefactos de cerâmica ou de pedra polida. Na África Austral comunidades de recolectores partilharam a savana com as populações de agricultores e pastores, estabelecendo relações de mútuo benefício. Nesta região, há cerca de três mil anos, a produção alimentar e a manufactura de cerâmica eram completamente desconhecidas.
A transição assumiu formas diversificadas nas várias regiões europeias. Algumas comunidades, principalmente as estabelecidas nos deltas dos grandes rios, adoptaram apenas um ou outro aspecto do novo tipo de vida, uma forma limitada de agricultura, o fabrico de vasilhas ou criação de apenas algumas espécies de gado. No Centro e Sul da Europa, em poucos milénios foi adoptado o modo de produção agrícola, as populações começaram a domesticar algumas espécies de animais e as comunidades a tornarem-se sedentárias, estabelecendo os seus acampamentos permanentes. Na Europa Oriental, na grande floresta e nas regiões circumpolares, sob condições ecológicas diferentes, a cultura recolectora prolongou-se para além da economia agrícola já praticada noutras regiões. O mesmo aconteceu nas estepes do norte da Europa. Com o derreter das camadas de gelo, os habitantes foram migrando para o norte mantendo aí a sua forma de vida. Na Escandinávia, já liberta dos glaciares, persistiram por muitos séculos as tradições de caça, pesca e recolecção. Este estilo de vida subsistiu em regiões árticas ou desérticas, onde a terra era menos própria para a agricultura.
As condições favoráveis, existentes no Próximo Oriente, contribuíram para um cultivo regular de cereais e criação de animais, que garantiam uma provisão de alimentos para todo o ano. Estes factores facilitaram a transição para o modo de produção de alimentos e permitiram o desenvolvimento dum hábito de vida sedentário em aldeias, que constituíram a base da formação de ulteriores transformações na estrutura económica, que marcaram o percurso histórico da região.
O continente asiático foi palco duma desigualdade no desenvolvimento das diversas regiões. Na Ásia Central, povoações cujos habitantes se dedicam à agricultura e criação de gado confinam com zonas de caçadores das estepes, criadores de gado que adoptaram a vida nómada em áreas semi-desérticas. No Sudeste Asiático observou-se uma situação com a economia de caça e recolecção a persistir após o aparecimento da agricultura, mantendo-se no entanto a existência de mútuas relações. Com muito poucas excepções, algumas comunidades continuaram, por longo tempo, a conviver com vizinhos agricultores ou até com mercadores. Na China, a expansão da cultivo do arroz, segundo uma técnica ainda actual, contribuiu para uma intensificação da actividade agrícola. No Extremo Oriente e Japão reveste-se de considerável interesse a pesca especializada e a actuação dos caçadores marinhos.
Na América do Norte encontram-se algumas áreas com situações ecológicas tão favoráveis que permitiam colheitas comparáveis às conseguidas com a agricultura, capazes de gerar excedentes e permitir a sedentarização. Enquanto surgem numerosas culturas baseadas na domesticação de plantas locais, grande parte da economia mantém-se dependente da recolecção de alimentos combinada com uma agricultura incipiente. Em algumas áreas foi presenciada a existência de sociedades complexas que evoluíram com base numa combinação de produção alimentar e recolha especializada de alimentos. Há conhecimento histórico de ter ocorrido, em algumas regiões, uma longa sucessão de colheitas ruinosas que forçaram a dispersão das aldeias e o regresso temporário das populações ao estilo de vida baseado na caça e na recolecção.
Na Mesoamérica, a população organizada em pequenos bandos igualitários de base familiar, deslocava-se sazonalmente de acordo com os recursos alimentares nas diversas partes do território. Estes grupos tornaram-se semi-sedentários à medida que a cultura de certas plantas, especialmente o milho, se tornava suficientemente produtiva de modo a permitir uma residência prolongada em locais favoráveis. As próprias comunidades de caçadores recolectores obtiveram avanços satisfatórios em vários campos da tecnologia da produção alimentar, bem como na organização da sociedade para a produção. Os conhecimentos básicos adquiridos deram lugar a uma fase intermédia e constituíram um factor crucial para o desenvolvimento e expansão duma forma de vida com agricultores e artesãos.
Na América do Sul, em regiões andinas, as populações estabeleceram circuitos de transumância nas terras altas, domesticação de lamas e guarda de rebanhos nas ravinas e, simultaneamente, caça e colheita de plantas nas terras baixas. A utilização de cereais não produziu alterações significativas no modo de vida das populações. A caça, a pesca e a recolecção continuaram a constituir os principais meios de subsistência. O cultivo ocupou sempre um lugar secundário dentro da economia destas comunidades. Nenhuma espécie de cultura de plantas podia suplantar, em quantidade e qualidade, a grande variedade de frutos, raízes, folhas e rebentos comestíveis que as populações tinham aprendido a explorar e que eram fornecidos pelos mais diversos meios ambientais.
Os aborígenes da Austrália, durante mais de 40 mil anos, até à nossa época, conservaram uma estabilidade e continuidade de estilo de vida nómada baseado na caça e recolecção. Não se tornaram agricultores ou domesticadores de animais. Mantinham contactos com populações da Nova Guiné, mas nem por isso adoptaram a agricultura por sementeira. Não lavravam a terra, mas utilizavam técnicas hortícolas, replantavam inhames e outros tubérculos, estimulavam o crescimento de árvores de fruto. Exploravam frutos secos tóxicos, da família das cicadáceas. Estes frutos, depois de extraído o veneno, eram moídos para a preparação duma espécie de farinha, com que era produzido, por fermentação, um “pão de cicadácea”. O fogo era utilizado como forma de aumentar a produção de alimentos, através da prática da agricultura de queimadas para encorajar o crescimento de plantas alimentares, regenerar as matas, aproveitar as cinzas como adubo e atrair os animais herbívoros para a sua captura. Estes eram, então, mais facilmente mortos à paulada ou com lanças. Tais caçadores não conheciam o arco e a flecha. As suas deslocações contínuas por regiões extensas, permitia-lhes uma recolha ampla de alimentos que ultrapassava as carências de forma mais eficaz do que com uma agricultura, difícil num terreno tão seco e dependente de fontes muito mais restritas. Não produziam excedentes alimentares nem armazenavam. No entanto, havia uma produção de utensílios e ferramentas essenciais, de vestuário de pele e confecção de adornos, semelhante à ocorrida noutros continentes.

2.3.06

Esboço-modelo de um projecto de investigação social

Título: Projecto de pesquisa acerca do papel das associações de imigrantes enquanto mediadores sócio-culturais na criação de novas abordagens políticas, atitudes e valores dos portugueses perante a imigração e a integração de minorias étnicas na sociedade portuguesa.

  1. Índice
  2. Nota prévia
  3. Esquema do projecto
  4. Sumário
  5. Apresentação do assunto
  6. Introdução
  7. Tema
  8. Delimitação do tema
  9. Definições operacionais ou Palavras-Chave
  10. Problema de pesquisa
  11. Hipóteses
  12. Significado ou Pertinência do Estudo
  13. Objectivos
  14. Justificação
  15. Fundamentação teórica
  16. Metodologia da pesquisa
  17. Plano de Acção
  18. Cronograma
  19. Custos
  20. Campo de Observação
  21. Amostragem e Representatividade Qualitativa
  22. Recolha de Dados
  23. Análise dos resultados
  24. Conclusões
  25. Bibliografia
  26. Anexos
  27. Glossário

Nota Prévia

Projecto, do latin pro-jicere, significa, literalmente, colocar adiante. Como tal, a elaboração de qualquer projecto depende de dois factores fundamentais: a capacidade de construir uma imagem mental de uma situação futura, e ainda da capacidade de conceber um plano de acção para ser executado num determinado tempo e que permitirá a sua realização. Portanto, o projecto elabora-se a partir de uma ideia, segue uma organização, e tem a missão de anticipar o trabalho definitivo. Desta forma, o projecto é pois uma das etapas do processo de elaboração, execução e apresentação da pesquisa. Esta necessita ser planeada com extremo rigor, caso contrário o investigador, em determinada altura, encontrar-se-á perdido num emaranhado de dados recolhidos, sem saber como dispôr dos mesmos ou até desconhecendo o seu significado e importância. Portanto, numa pesquisa, nada se faz ao acaso. Desde a escolha do tema, fixação dos objetivos, determinação da metodologia, recolha dos dados, a sua análise e interpretação para a elaboração do relatório final (monografia, dissertação ou tese), tudo é previsto no projecto de pesquisa. Um projecto de pesquisa deve, portanto, responder às clássicas questões: o que fazer? Porquê? Para quê? Para quem? Onde? Como? Com quê? Quanto? Quando? Quem vai fazer? Ou seja, traçar um caminho eficaz que o conduza a atingir os objectivos a que se propõe. É no projecto de pesquisa que se deve delimitar o tema; formular o problema; enunciar as respostas; definir na visão global e abrangente, o que se pretende alcançar com a execução da pesquisa; fazer aplicação dos objectivos gerais a situações particulares; explicar os motivos que justificam a pesquisa, quer sejam de ordem teórica, prática ou social; descrever o campo de observação, as suas unidades observadas e as variáveis que interessam à pesquisa; no caso do recurso à amostragem, justificar e apresentar o modo como a amostra será selecionada e as suas características, bem como o local, as unidades de observação, e quais as variáveis que serão controladas, como serão controladas, e ainda qual o plano de experimentação que será utilizado; descrever o instrumento de pesquisa que vai ser utilizado, que informação se pretende obter com eles, e como é que o instrumento será usado ou aplicado para obter estas informações; quais as hipóteses estatísticas enunciadas; como é que os dados obtidos serão codificados; que tabelas serão feitas; que provas estatísticas serão utilizadas para verificar as hipóteses; em que nível de significância; a previsão sobre interpretação dos dados; definir o tempo que será necessário para executar o projecto, isto é, para realizar a pesquisa, dividindo o processo em etapas e indicando que tempo é necessário para realização de cada etapa; e prever os gastos que serão feitos com a realização da pesquisa, especificando cada um deles.

Esquema do projecto

Antes de mais, convém salientar que não existe um esquema uniforme, único e universal para todos os projectos. Pelo contrário, cada investigação é que irá ter um esquema próprio que é elaborado mediante as necessidades do pesquisador e das inerências da sua investigação. Como se compreenderá, são os diferentes ajustes que se podem fazer ao esquema que seguem as necessidades específicas de cada investigação. Contudo, convém sublinhar que um projecto de pesquisa é somente um esboço prévio de uma investigação, pelo que será acima de tudo um guia, um mapa de indicações sumárias, uma espécie de armazém vazio que será posteriormente preenchido com todo o trabalho efectuado na investigação. Em caso algum se pretende que seja um esquema rígido, normativo e inflexível, ao qual temos necessariamente de cumprir, mas também não o podemos deixar de parte a partir do momento em que começamos a ler a bibliografia ou recolher dados para a nossa investigação. O ideal é não cair em extremos: nem esquecer o carácter flexível do projecto de pesquisa, nem tomá-lo como algo absolutamente imutável, porque poderemos correr o risco de perder a imprescindível liberdade de escolha e actuação que é sempre tão importante em qualquer investigação. O esquema de projecto seguido para esta investigação, em termos gerais, foi o seguinte: a escolha de um tema de pesquisa e a formulação do problema de estudo; a justificação da importância deste estudo, contextualizando-o no espaço e no tempo; a construção de uma base teórica que fundamentem a investigação; a definição de objectivos gerias e específicos; a construção de um plano de trabalho e de uma metodologia adequada à observação dos objectos de estudo e à recolha dos dados pertinentes; a calendarização do estudo através de um cronograma e a respectiva análise das informações recolhidas num somatório global que aponte a conclusões e que lance algumas respostas ao problema inicial da investigação.

Sumário

O objectivo central desta pesquisa é o estudo do papel desempenhado pelas associações de imigrantes na formação de políticas de integração social, a sua influência na reestruturação das identidades e o seu impacto nas interacções sociais entre os indivíduos de minorias étnicas e os portugueses, enquanto membros da mesma sociedade. Os grupos sociais que se pretende estudar são constituídos por portugueses, indivíduos socialmente designados como negros, ciganos e imigrantes da Europa de Leste e que poderão ser percepcionados e configurados, de forma simultânea ou não, como categorias étnicas, sociais, rácicas, nacionais, etc. Importa neste estudo examinar a forma como os grupos em análise constroem o Nós, ou seja, como definem o seu Eu ou os seus vários Eu (grupos étnico, rácico, nacional, imigrante, etc.) e o que pensam da sociedade portuguesa, ou seja, como auto-definem os Outros (a maioria e outros grupos minoritários). Sendo a sociedade um espaço social e simbólico, e também um «espaço de diferença», pois é nesta que se expressam e se afirmam as identidades.

Apresentação do assunto

Como se significa no título, a ideia central que presidiu à sua concepção, realização e estudo é detectar as ideias e impressões que a população portuguesa e a imigrante têm uma da outra em vários aspectos das suas vidas. Os assuntos que irão ser aprofundados através deste projecto de investigação dizem respeito às acções que as associações de imigrantes desenvolveram na mediação das mudanças verificadas na situação social dos imigrantes e nas atitudes dos portugueses a seu respeito, analisando que perspectivas de inserção na sociedade portuguesa se lhes oferecem, designadamente em termos das suas relações efectivas de trabalho, familiares e culturais, e estabelecendo o confronto das respectivas representações e valores. Serão estudados ainda as relações entre o emprego/desemprego, a raça/etnia, a análise das barreiras que são colocadas às minorias étnicas; as características sócio-económico-culturais de cada grupo étnico; o estudo do modo como a localização espacial e socio-cultural das minorias étnicas influencia a criação de estereótipos, e as suas implicações políticas, económicas e sociais.

Introdução

Este estudo não pretende de todo ser um ponto de chegada, mas antes o início de um longo caminho a explorar em investigações futuras. De facto, o papel de mediação social efectuado pelas associações de imigrantes e de minorias étnicas trata-se de um fenómeno ainda pouco aprofundado. Com efeito, pouco se sabe sobre esta forma de comunicação dos indivíduos para as associações e das associações para a sociedade e, posteriormente, para a opinião pública. No entanto, sabemos que estas associações já ocupam um espaço relevante na sociedade, e dão forma a toda uma dinâmica de discursos políticos, comportamentos, atitudes, e valores que irão nortear e influenciar muito daquilo que é percepcionado pelos portugueses acerca da actuação dos seus membros na sociedade. Dada a posição social ocupada pelos grupos em análise, parece pertinente conhecer como é que estes se relacionam entre si e com os outros, sendo que através do contacto com as associações de imigrantes este processo de construção da identidade e da diferença pode ser melhor percepcionado. Numa perspectiva de aprofundamento e de aproximação ao «objecto real», procurar-se-á mobilizar uma pluralidade de técnicas: a análise documental, a análise estatística, a entrevista e a organização de grupos de discussão.

Tema

O papel das associações de imigrantes na sociedade portuguesa.

Delimitação do tema

O papel específico das associações de imigrantes reconhecidas pelo Estado português na criação de diálogos e acções integradoras dos seus membros na sociedade portuguesa, bem como na influência das abordagens políticas, atitudes e valores dos portugueses face à imigração, aos imigrantes e às minorias étnicas, na área metropolitana de Lisboa.

Definições operacionais ou palavras-chave

Todas as expressões ou termos de alguma forma considerados técnicos (não do conhecimento geral) que apareçam na definição do problema ou sub-problemas devem ser definidas, tal como o investigador as considerará no seu estudo. Qualquer termo ambíguo ou que tenha um significado especial no contexto desse estudo, ainda que de uso comum, deve ser clarificado. Definições operacionais, ainda que devam ser incluídas nos procedimentos, podem também ser explicadas nesta secção, se isso for considerado útil para facilitar a discussão do problema. Os termos escolhidos foram: integração social, imigrantes, relações inter-étnicas, identidades, cultura.

Problema de pesquisa

É o momento de definir uma problemática na qual o tema escolhido ganhe sentido. Desta forma, o problema que temos de investigar trata-se de averiguar em que medida a actuação das associações de imigrantes exercem, de facto, alguma influência nas atitudes, nos valores, no comportamento e na integração social dos seus membros, bem como na percepção geral do seu valor etno-cultural pelos portugueses; e se essa influência também é exercida ao nível dos discursos políticos das autoridades portuguesas.

Hipóteses

Temos de compreender as hipóteses como suposições formuladas pelo pesquisador a respeito de possíveis soluções para um problema colocado na pesquisa. Neste sentido, o uso do procedimento hipotético é fundamental para que a partir de sua formulação o pesquisador identifique as informações necessárias, evitando a dispersão e focalizando segmentos determinados do campo de observação. Na verdade, as hipóteses assumem um carácter de condutoras do pensamento. A hipótese é como uma preposição provisória, pressuposições que devem ser verificadas, extensões lógicas do conhecimento existente mas que ainda não foram verificadas. Não são conclusões declaradas previamente mas sim o resultado de uma cuidadosa revisão da literatura, que permite saber com rigor o que é conhecido acerca do tema em questão. De certa forma, as hipóteses são previsões plausíveis e como tal estão bastante relacionadas com a imaginação e a capacidade do investigador. Contudo, caso este não veja razão para predizer o produto final do seu estudo, deve omitir esta parte. Ainda assim, poderemos colocar desde já algumas hipóteses: hipótese 1: as associações de imigrantes influenciam os seus membros a identificaram-se com valores culturais colectivos e de pertença a uma minoria étnica específica, e influenciam em certa medida o poder político a adequar o seu discurso, bem como a responder aos seus problemas perante a sociedade portuguesa, que afirma uma determinada opinião com base nesta mesma influência. Hipótese 2: as associações de imigrantes apesar de exercerem uma influência social e etno-cultural nos seus membros, não influenciam os discursos políticos das autoridades portuguesas, nem as opiniões dos portugueses. Hipótese 3: as associações de imigrantes exercem a par de uma grande influência nos valores e atitudes dos seus membros, determinadas mudanças nas lógicas de pensamento dos portugueses e da sua percepção acerca das minorias étnicas.

Significado ou Pertinência do Estudo

O presente trabalho objectiva verificar a realidade social da temática das relações inter-étnicas num contexto urbano, expondo de uma forma clara o papel desempenhado pelos diferentes actores das associações de imigrantes e do tecido social português, e ainda suscitar algumas questões que muitas vezes se evitam falar na sociedade portuguesa, como o racismo, a influência dos grupos étnicos nos poderes políticos, ou ainda os sentimentos que os indivíduos nutrem entre si face ao que é diferente. A sua originalidade quando comparada a outras pesquisas nasce da sua abrangência, multidisciplinaridade e carácter eminentemente social. Daí a sua importância, ainda para mais numa época em que a globalização exerce o crescimento de novas redes de contacto e de relações sociais entre diferentes pessoas, com diferentes crenças religiosas, culturas, valores e atitudes, num ambiente muitas vezes forçado ou de potencial tensão social. Vejamos o que se passa actualmente em França. A pertinência deste estudo justifica-se na sua capacidade de, sustentada em bases científicas e com dados legítimos e fidedignos, poder deixar algumas propostas de actuação com vista ao melhoramento das relações sociais e do desenvolviemnto da sociedade portuguesa. O método que utilizamos foi a Investigação Qualitativa, visando uma descrição fiel da realidade existente.

Objectivos

Devemos expôr a indicação do que se pretende alcançar com a pesquisa a ser realizada. Assim como nas demais partes do projecto, deve-se expor os argumentos com clareza e de maneira encadeada. Com este estudo pretendemos aprofundar a pesquisa do fenómeno das relações étnicas em contextos urbanos, visando o objectivo de perceber quais as razões que fomentam a criação e a procura de associações de imigrantes em Portugal, assim como estabelecer um breve perfil dos seus membros, e padrões de opinião por parte dos portugueses. Procura-se igualmente, através destas abordagens, apreender a dinâmica e a complexidade dos fenômenos sociais em seu contexto natural, apresentando-se como alternativa para a rigidez, a fragmentação e o distanciamento entre pesquisador e objectos pesquisados.

Justificação

A justificação deve conter a motivação (a da relevância do problema e não a de ordem pessoal) para a realização da pesquisa. Trata-se da questão da relevância. Das razões de ordem prática e ou teórica que justificam a realização da pesquisa. Através da justificação, o pesquisador convencerá ou não da importância ou necessidade do projecto.Quer sejam de ordem pessoal ou práctica, social e científica ou teórica, este projecto de pesquisa pretende acima de tudo demonstrar os resultados prácticos do seu trabalho. Tal como a sua aplicação ou utilidade potencial dos resultados obtidos, o seu significado será julgado principalmente pelo grau em que o projecto ultrapasse os limites do conhecimento actual ou teste de forma inovadora os resultados de outros estudos. Isto implica naturalmente um claro domínio do conhecimento relativo ao assunto. Por esta razão esta secção deve ser finalizada após a revisão da fontes literárias e bibliográficas, e deverá responder à questão: «Porque deve este estudo ser realizado e deverá ou não (sim na maioria dos casos) incluir informação documentada que saliente a sua necessidade, directa ou indirectamente».

Fundamentação teórica

Uma das etapas mais importantes de um projecto de pesquisa é a fundamentação teórica ou revisão de literatura. A revisão de literatura refere-se à fundamentação teórica adoptada para tratar o tema e o problema de pesquisa. Por meio da análise da literatura publicada podemos traçar um quadro teórico e elaborar a estruturação conceptual que dará sustentabilidade ao desenvolvimento da pesquisa. A revisão da literatura e fundamentação teórica resultará de um processo de levantamento e análise do que já foi publicado sobre o tema e o problema de pesquisa escolhidos. Permitirá um mapeamento de quem já escreveu e o que já foi escrito sobre o tema e/ou problema da pesquisa. O projecto de pesquisa deve estar articulado dentro de uma determinada realidade com um quadro de referência teórica que é adaptado de acordo com o sector em que se dá a pesquisa. Mas a finalidade da pesquisa científica não é apenas um relatório ou descrição de factos levantados empiricamente, mas o desenvolvimento de um carácter interpretativo, no que se refere aos dados obtidos. Para tal, é imprescindível correlacionar a pesquisa com o universo teórico, optando-se por um modelo que serve de base à interpretação do significado dos dados e factos recolhidos. As informações devem, portanto, ser interpretadas à luz de uma determinada teoria. Os fundamentos teóricos sustentarão o problema de pesquisa. Não se trata de elaborar todo um novo modelo teórico, com todos os detalhes e construções que isso implica, mas antes de informar os leitores acerca das bases conceptuais em que nos inspiramos, dos seus autores, teorias e preposições gerais dentro da qual situaremos a nossa investigação. Neste caso, e devido às próprias contigências deste trabalho académico, não iremos enunciar uma extensa formulação teórica, mas simplesmente enquadrar este pequeno projecto de investigação no paradigma teórico da investigação construtivista (também denominado naturalista ou hermenêutico). Este paradigma baseia-se no conhecimento que nos ajuda a manter a vida cultural, a nossa comunicação e significado simbólicos. Forjado pela metodologia qualitativa cuja lógica segue um processo circular que parte de uma experiência, e trata de interpretrar no seu contexto os diversos pontos de vista dos implicados. Não se buscam verdades últimas e sim relatos. O desenho da investigação é aberto à invenção, à obtenção de dados, ao descobrimento, à análise e à interpretação, ficando caracterizado do ponto de vista oncológico, por um relativismo derivado das realidades construídas em contextos concretos. Vê o significado surgindo no processo de interacção entre pessoas. O significado de uma coisa cresce dos modos como outras pessoas actuam em relação à pessoa que vê a coisa. O interaccionismo simbólico vê os significados como produtos sociais, e consiste de três premissas básicas: os seres humanos agem para com as coisas na base dos significados que as coisas têm para eles; estes significados são o produto de interacções sociais na sociedade humana; estes significados são modificados e manipulados através de um processo interactivo que é usado por cada indivíduo ao lidar com os signos que encontra. Uma perspectiva fenomenológica é diferente de abordar o comportamento humano com o objectivo de procurar factos e causas. Requer antes tomar em conta a existência de perspectivas divergentes sobre as situações e reforça a uma compreensão interpretativa da interacção humana. Os fenomenologistas não assumem que sabem o que as coisas significam para as pessoas que estão a estudar. A fenomenologia começa com o silêncio. Os fenomenologistas realçam os aspectos subjectivos do comportamento das pessoas, tentam entrar no mundo conceptual dos seus sujeitos para compreender qual o significado que constroem em torno dos acontecimentos das suas vidas diárias. Acreditam que múltiplas formas de interpretar experiências estão disponíveis para os seres humanos e que a realidade é constituída pelo significado das nossas experiências. A realidade é pois socialmente construída.

Metodologia da pesquisa

Nesta etapa deve-se mostrar como será executada a pesquisa e o desenho metodológico que se pretende adoptar: será do tipo quantitativa, qualitativa, descritiva, explicativa ou exploratória, será um levantamento, um estudo de caso, uma pesquisa experimental, etc. Ou seja, o investigador apresenta, de forma detalhada, os procedimentos metodológicos que irá empregar no processo de estudar o seu problema. A estrutura pode assentar nos sub-problemas, nas hipóteses a testar, ou simplesmente representar os passos necessários apresentando-os de forma cronológica. Qualquer que seja a estrutura escolhida, os seguintes aspectos não devem ser esquecidos: nem todos os projectos envolverão todas as partes indicadas e alguns incluirão mesmo tópicos aqui ignorados. Actualmente, há uma grande variedade de pesquisas que recebem a denominação de qualitativas: naturalistas, pós-positivistas, antropológicas, etnográficas, estudos de caso, hermenêuticas, fenomenológicas, ecológicas, construtivistas. Talvez a utilização do termo qualitativa não seja um qualificativo adequado para designar tais modalidades de pesquisa visto que as pesquisas ditas quantitativas também analisam qualidades dos seus objetos de estudo. Na falta de condições, no momento, de selecionar uma denominação mais adequada ao que se conhece como pesquisa qualitativa, optei por apresentar os argumentos daqueles que buscam defender a singularidade deste tipo de pesquisa em relação à outros. Stake (1983) menciona a importância em distinguir as abordagens quantitativa e qualitativa de pesquisa afirmando, todavia, que todos os pesquisadores quantitativos fazem discriminações qualitativas, assim como todos os pesquisadores qualitativos descrevem importantes quantidades em seus relatos. Segundo ele, e corroborado por Alves (1991), a diferença reside numa questão de ênfase que as pesquisas quantitativas e qualitativas conferem aos aspectos dos objetos investigados. Caracterizam a pesquisa quantitativa por extrair dados de um grande número de casos sobre um pequeno número de variáveis confrontando-a à pesquisa qualitativa que obtém dados de um pequeno número de casos sobre um grande número de variáveis. Na pesquisa qualitativa enfatiza-se a compreensão da singularidade e a contextualidade de factos e eventos. No entanto, Stake esclarece que esta não é uma distinção fundamental. A distinção mais importante é de natureza epistemológica entre as generalizações que os dois tipos de pesquisa proporcionam. Para este projecto de pesquisa, a metodologia utilizada foi então a da Investigação Qualitativa, porque nos permite a descrição e a compreensão interpretativa na recolha e análise dos dados dos actores intervenientes, na medida em que integram acontecimentos, eventos implícitos e verbalizados: percepções, representações, opiniões, discursos, gestos, práticas, experiências, etc. As técnicas utilizadas foram: observação directa e participante. Este tipo de observação é um método que determina que o investigador realize observações fazendo parte de um grupo ou de uma organização. O investigador insere-se no contexto do tema que vai estudar. As técnicas específicas utilizadas serão numa primeira fase as conversas informais, que serão importantes para os primeiros contactos de modo a estabelecer uma empatia, com o intuito de promover a cooperação e participação dos indíviduos observados no nosso trabalho. Usaremos também estudos de caso individuais, de instituições, de observação e de histórias de vida já realizados. Quando o foco da pesquisa é algum problema ou questão específica, procede-se à recolha e análise dos dados a fim de desenvolver um modelo descritivo que englobe todas as instâncias do fenómeno: depoimentos pessoais, entrevistas não-estruturadas ou semi-estruturadas (individuais ou coletivas), análises de discursos, análises documentais, isolados ou nas mais diversas combinações. Chizzotti (1991) afirma que o pesquisador mobiliza a acuidade inventiva, sua habilidade artesanal e sua perspicácia para elaborar a metodologia da pesquisa, "(...) o que não quer dizer que outros métodos, inclusive quantitativos, não possam ser usados" (Alves, 1991, p.60). O nosso suporte será pois da análise documental, das análises estatísticas, das entrevistas, dos questionários, das filmagens e gravações sonoras. Nas metodologias qualitativas, os sujeitos de estudo não são reduzidos a variáveis isoladas ou a hipóteses, mas vistos como parte de um todo, em seu contexto natural, habitual. Considera-se que ao reduzir pessoas a agregados estatísticos, perde-se de vista a natureza subjetiva do comportamento humano. Há uma possibilidade de conhecer melhor os seres humanos e compreender como ocorre a evolução das definições de mundo destes sujeitos fazendo uso de dados descritivos derivados de registros e anotações pessoais, de falas de pessoas, de comportamentos observados. Com estas características, a metodologia qualitativa tem-se apresentado como uma modalidade de pesquisa extremamente útil para a psicologia, visto que permite o estudo de conceitos relativos a sentimentos, emoções (dor, sofrimento, beleza, esperança, amor) da forma como são experienciadas pelas pessoas. Segundo Chizzotti (1991, p.80), «a pesquisa não pode ser o produto de um observador posicionado fora das significações que os indivíduos atribuem aos seus actos; deve, pelo contrário, ser o desvelamento do sentido social que os indivíduos constroem em suas interações quotidianas». Em suma, a metodologia mostra os caminhos a serem adotados para a solução do problema. É através dela que se avalia o conhecimento técnico que o pesquisador tem para executar o projecto de pesquisa. Nos métodos qualitativos, o pesquisador é necessariamente envolvido na vida dos sujeitos, visto que seus procedimentos de pesquisa baseiam-se em conversar, ouvir, permitir a expressão livre dos interlocutores. Tais procedimentos acabam por resultar num certo clima de informalidade e o simples fato dos sujeitos poderem falar livremente a respeito de um tema sem que um roteiro pré-estabelecido ou questões fechadas lhe tenham sido impostas, colabora para diminuir o distanciamento entre pesquisador e pesquisados. Esta proximidade exige que o pesquisador esteja autoexaminando-se constantemente, para não perder de vista o sentido inicial da pesquisa e para que consiga conduzir os encontros com os indivíduos pesquisados na direcção das respostas procuradas. Entre as habilidades necessárias para quem conduz este tipo de pesquisa, podemos enumerar a atenção ao fenômeno estudado, a capacidade para ouvir, a aquidade para efectuar observações, a disciplina para efectuar registos, organização para armazená-los e classificá-los,a capacidade para realizar sínteses,a habilidade para colocar-se na perspectiva do outro como forma de facilitar a comunicação e conseguir colaboração, a paciência e perspicácia para captar nos acontecimentos da vida diária os aspectos que trarão a compreensão desejada daquilo que se está a estudar. Talvez a habilidade mais difícil de desenvolver é a de compreender o contexto onde a pesquisa será realizada, suas estruturas de poder, suas redes de comunicação, seus valores e símbolos, controlando a ansiedade de intervir sobre este contexto. Bogdan & Taylor (1975) sugerem que o pesquisador olhe para o fenómeno de uma forma aberta, ou seja, como se o visse pela primeira vez, como se nada soubesse sobre ele, como se estivessem sendo apresentados um ao outro. A relação entre pesquisador e pesquisados é dinâmica e constante durante todo o processo de pesquisa. No entanto, podemos sempre pôr toda esta metodologia em questão, e procurar novas formas de aceder a informações. Senão vejamos esta exposição de Allan Kellehear:

(...) “existe hoje, nos círculos das ciências sociais uma singela e persistente crença de que o conhecimento acerca das pessoas fica disponível através de uma simples pergunta. Interrogamos as pessoas acerca delas próprias e elas respondem; supõe-se que importantes verdades acerca das pessoas são obtidas da melhor forma através da conversa, interrogando-as umas vezes directa, outras vezes subtilmente acerca das suas experiências, atitudes e crenças. O problema com este pressuposto é que aquilo que se ganha «perguntando simplesmente» é muitas vezes moldado pela dinâmica que envolve a interacção entre o investigador e o investigado. Isto é assim porque o acto de obtenção de dados dos respondentes ou informantes pode ele próprio afectar as característicos das respostas obtidas. Uma consequência disto pode ser uma necessidade de realizar a «interrogação das experiências, atitudes ou crenças» de outras maneiras menos directas. (…) As medidas não interferentes são não recativas no sentido em que se presume que evitam problemas causados pela presença do investigador.(…) Por outras palavras, as questões acerca das experiências, das atitudes e das crenças podem ser respondidas com tanta eficácia observando o que as pessoas fazem, observando evidencias físicas de vários tipos ou fazendo registos escritos ou falados como levando a cabo entrevistas e questionários(…) Deve-se chamar a atenção dos investigadores sociais para a necessidade de pensarem criativamente as fontes e o uso dos seus dados. (…). As entrevistas e os questionários introduzem-se como um elemento estranho no seio do contexto social que pretendem descrever, refazem atitudes, suscitam desempenhos, respostas atípicas, restringem-se àqueles que são acessíveis e cooperam, e as respostas obtidas são produzidas em parte por dimensões respeitantes a diferenças individuais irrelevantes para o tema abordado. As entrevistas e os questionários criam atitudes em parte porque os respondentes tentam geralmente suscitar impressões de si próprios de molde a manter o seu estatuto aos olhos do entrevistador (...) a participação num estudo pode mudar as atitudes e o comportamento daqueles que estão a ser estudados. (…) Os métodos não interferentes são recomendáveis enquanto maneiras de produzir dados complementares aos obtidos pelos métodos de recolha directa, mas com diferentes vantagens e inconvenientes. Pode argumentar-se que estes métodos são valiosos em si mesmos porque encorajam abordagens divertidas e criativas dos dados. (…). Aquilo que isto implica é uma postura eclética, para não dizer ecuménica, relativa à recolha de dados. Os cientistas sociais podem encontrar fontes de dados úteis derivando-os de outras tradições metodológicas. Os dados que consistem em traços físicos requerem que se pense como um cientista forense. Os métodos de captação de dados reflectem as sensibilidades do etólogo. A pesquisa documental a justa-se às visões dos estudos historiográficos e culturais. Todas estas coisas devem ser parte do reportório metodológico normal do cientista social.(…). Não é obrigatório para os métodos não interferentes que os dados falem por si próprios, mas existe uma preferência por dados que falem sem nada sugerirem. (…). Cada vez mais a recolha de dados será mediada não só pela presença ou ausência literal do investigador, mas também, de maneiras provavelmente complexas, pel sua presença também virtual. Novos métodos de pesquisa e novas fontes de dados abrem novas saídas metodológicas e encorajam a revisitação das antigas.”

Como diz uma conhecida personagem de Sir Arthur Conan Doyle:

«I can never bring you to realize the importance of sleeves, the suggestiveness of thumbnails, or the great issues that may hang from a bootlace.»

Sherlock Holmes to Watson ("A Case of Identity")

Plano de Acção

A elaboração do plano de acção consiste em definir com precisão quem são os actores ou as unidades de intervenção; como se relacionam os actores e as instituições: convergência, tensões; quem toma as decisões; quais são os objectivos (ou metas) tangíveis da acção e os critérios de sua avaliação; como dar continuidade à acção, apesar das dificuldades; como assegurar a participação da população e incorporar as suas sugestões; como controlar o conjunto do processo e avaliar os resultados. Neste estudo, assentaremos o nosso plano de acção na escolha das estratégias metodológicas de pesquisa. Como foi já foi dito, é necessário lembrar que múltiplas escolhas podem ser feitas e em alguns casos, dependendo da investigação, devem mesmo ser feitas para que se proporcione uma aproximação mais adequada ou abrangente ao tema a ser estudo. Podem ser consideradas estratégias de investigação como estudos de caso, observações participantes, investigações documentais, entrevistas formais ou não formais, breves ou em profundidade, dirigidas, semi-dirigidas, ou abertas, as histórias de vida ou outras formas de estudo biográficos como os biogramas, os grupos de discussão, grupos focais ou estratégias afins, observações planeadas de diferentes formas, conforme os objectivos da investigação.

Cronograma

Todo o projecto de pesquisa deve ter, a priori, um escalonamento no tempo, ou calendarização de todas as fases e tarefas da pesquisa a ser desenvolvida. Sugere-se o quadro abaixo apenas como modelo potencial à nossa pesquisa:

MESES

ETAPAS DA PESQUISA: 1 2 3 4 5 6 7 8

Pesquisa bibliográfica X X X
Recolha e análise de dados X X X
Metodologia X X
Elaboração do Trabalho X X X
Revisão gramatical e ortográfica X
Relatório final X X
Obs.: Dependendo do projecto, poderão ser incluídas outras etapas. As durações das etapas não deverão necessariamente as exemplificadas neste modelo.

Custos

Nesta secção devemos definir o âmbito e os limites do problema. Quase sempre, a este deparam-se algumas limitações prácticas que podem estar relacionadas com falta de tempo, recursos, pessoal ou outros. Quando estes factores são identificados, devem ser assumidos como limitações do estudo e descritos de forma natural e desassombrada. O investigador deve delinear claramente o universo no qual as conclusões que retira são aplicáveis, nomeadamente em termos de tempo, área geográfica, características dos indivíduos (idade, nível e campo profissional, etc.), materiais e conteúdo temático. À partida, neste breve projecto de pesquisa podemos adiantar que a investigação terá um elevado custo em termos de carga horária, envolverá muitas deslocações a vários pontos do concelho de Lisboa, com inerentes despesas de deslocação e alimentação. A par destes, teremos de contar com os custos logísticos da pesquisa. Respondendo à questão, o orçamento distribui os gastos por vários itens, que devem necessariamente ser separados. Inclui: a) pessoal – do coordenador aos pesquisadores de campo, todos os elementos devem ter registados os seus ganhos, quer globais, mensais, semanais ou por hora/actividade; b) material, subdivididos em: b.1) elementos consumidos no processo de realização da pesquisa, como papel, canetas, lápis, cartões ou plaquetas de identificação dos pesquisadores de campo, encadernação etc.; b.2) elementos permanentes, cuja posse pode retornar à entidade financiadora, ou serem alugados, computadores, câmaras de filmar, gravadores de som, etc.

Campo de Observação

Uma pesquisa pode abranger uma comunidade geograficamente concentrada ou espalhada. Neste caso, só actuaremos na área Metropolitana de Lisboa.

Amostragem e Representatividade Qualitativa

A questão da amostragem e da representatividade é um factor discutível: alguns excluem a pesquisa por amostra; outros recomendam o uso de amostragem; e uma terceira posição defende ainda a valorização de critérios de representatividade qualitativa. É importante realizar observações suficientes dos indivíduos certos, nos locais certos para se obter um quadro representativo. É igualmente importante não fazer mais observações do que o necessário para se reduzir o custo em termos de tempo, energia e dinheiro referente à recolha de dados. A amostragem ajuda a obter resultados úteis das observações estruturadas a um custo mínimo. É necessário resolver três questões principais de amostragem para o uso de observações estruturadas: a selecção de método apropriado de amostragem, definição de um nível adequado de selecção e decisão sobre o tamanho da amostra. Normalmente isto requer a assessoria de um técnico de estatístca; a seguir apresenta-se uma breve análise. Neste estudo iremos partir dos indivíduos de ambos os sexos que sejam membros das associações de imigrantes e aos portugueses em geral, efectuando uma amostragem aleatória simples mas separada por grupos, onde todos os elementos da população possuem igual oportunidade de serem seleccionados. Quando já se tiverem identificado os procedimentos de amostragem e os níveis de selecção poder-se-á tomar uma decisão em relação ao tamanho da amostra. Não é fácil decidir sobre o tamanho da nossa amostra. Se pretendemos aproximar-nos de uma amostra com um tamanho verdadeiramente representativo, teremos que aplicar cálculos estatísticos, sendo necessário para tal o apoio de um técnico de estatística. Uma regra básica sobre o tamanho das amostras diz que é necessário um mínimo de trinta unidades para fornecer uma base suficiente para as análises mais simples. Em geral, se o tamanho da população total for conhecido, é razoável elaborar uma amostra de 10 a 20 por cento, tomando em consideração o objectivo do estudo, a população total, a variação dos grupos populacionais, bem como o procedimento de amostragem aplicado.

Recolha de dados

A recolha de dados será efectuada por equipas de observação e pesquisadores. As principais técnicas utilizadas serão as entrevistas colectivas ou individuais, questionários convencionais, estudo de arquivos ou jornais, entre outras. Serão formados diversos grupos de observação mediante um treinamento prévio específico do pessoal. Todas as informações recolhidas pelas diversas equipas de observação e pesquisadores de campo serão transferidas ao coordenador geral, onde serão discutidas, analisadas e interpretadas.

Análise dos resultados

Na introdução deste novo capítulo deve ser novamente definido o problema. O âmbito do estudo deve também ser resumido, incluindo o número de sujeitos da amostra e os instrumentos utilizados para recolher os dados. Pode também ser apropriado fazer uma breve explicação dos procedimentos utilizados para recolher, agrupar e analisar os dados. Deve referir-se o grau de confiança escolhido para os valores estatísticamente significativos. Tal como nos outros capítulos, deve dar-se ao leitor uma ideia da organização seguida através dos subtítulos que serão objecto de análise. De início deve explicar-se a organização ou sequência pela qual os resultados serão apresentados. Será então necessário explicar cada resultado estatístico em termos do seu grau de significância ou indicar que não é significativo, se for esse o caso. Deve referir-se a informação estatística que é importante e apropriada para o leitor (médias, desvios-padrão, resultados de testes “post hoc”, correlações, etc.), indicando sempre os quadros em causa. Principalmente, é importante referir no texto os valores das diferentes provas estatísticas acompanhadas das respectivas margens de erro. Em suma, cada resultado será apresentado numa tabela que inclui um resumo da informação estatística de cada cálculo efectuado, quais as hipóteses estatísticas enunciadas; como os dados obtidos serão codificados; que tabelas serão feitas; que provas estatísticas serão utilizadas para verificar as hipóteses; em que nível de significância; e a previsão sobre a interpretação dos dados.

Conclusões

Sob este cabeçalho devemos apresentar o enquadramento do problema. A revisão deve ser estruturada segundo grandes ideias e temas, e não como uma desordenada compilação da investigação já dedicada ao problema em causa. Não devemos estar demasiado limitados ao próprio problema. Devemos antes considerá-lo de uma forma abrangente, relacionando-o com outros campos de estudo. Todas as fontes devem ser documentadas de forma completa. A revisão da literatura deve incluir os estudos mais recentes sobre o problema, permitindo assim uma base lógica e actual para os pressupostos e hipóteses. A partir do momento que iniciarmos o trabalho na biblioteca, é importante determinar tão cedo quanto possível as áreas gerais que a revisão vai incluir. Isto fornecerá uma linha orientadora para melhor enquadrar os estudos que revemos no contexto do próprio problema. Esta linha orientadora pode naturalmente ser expandida ou limitada à medida que a revisão se desenvolve. Devemos revelar ao leitor a orientação seguida no trabalho e eventualmente a razão para essa organização e não outra. Um breve resumo da revisão da literatura deve ser incluído criando ao leitor a expectativa dos temas que serão versados. Naturalmente, não podemos chegar ainda a qualquer conclusão acerca da temática que este projecto de pesquisa procura estudar, sem a recolha e análise dos dados. No entanto, poderemos comparar expectativas e pressupostos pessoais acerca das conclusões que esperávamos ter, e as obtidas realmente.

Bibliografia

Deve conter a bibliografia utilizada – e devidamente citada no decorrer do projecto – referente ao assunto de pesquisa. Somente as obras citadas ou mencionadas explicitamente no texto do projecto podem ser citadas como referências bibliográficas. Todas as fontes mencionadas ao longo do projecto devem ser listadas por ordem alfabética. Aqui iremos apresentar apenas algumas referências de literatura que abordam determinados assuntos que este projecto de pesquisa procura investigar, bem como as fontes que nos ajudaram na realização deste trabalho académico.

CASTRO D’AIRE, Teresa.: O Racismo. Temas da actualidade S.A. Lisboa, 1996.

FENTON, Steve.: Etnicidade. Colecção epistemologia e sociedade. Instituto Piaget, 2003.

FROST e HOEBEL, Everett L. E. Adamson.: Antropologia Cultural e Social. Editora Cultrix, São Paulo, 1978.

MOREIRA, C. D.: Identidade e diferença: os desafios do pluralismo cultural. Lisboa: ISCSP, 1996.

VERMEULEN, Hans e Govers, Cora.: Antropologia da etnicidade, Lisboa. Fim de século, 1994.

POUTIGNAT, Philippe e Streiff-Fenart, Jocelyne.: Teorias da etnicidade: seguido de Grupos étnicos e suas fronteiras de Fredrik Bart, S. Paulo.: Unesp (FEU), 1997.

HARGREAVES, A.: Immigration, race and ethnicity. London: Routledge. 1999.

SIMMEL, Georg.: Soziologie. Untersuchungen über die Formen der Vergesellsschaftung (Sociologia. Estudos sobre as formas de sociação). Berlim, Duncker e Humblot Editores, 1908.

TITIEV, Mischa.: Introdução à Antropologia Cultural. Serviço de educação e bolsas, Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa, 1969.
__________________________

ANDRADE, Maria Margarida de. Introdução à metodologia do trabalho científico. São Paulo: Atlas, 1999.

BEAUD, Michel. Arte da tese. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.

ECO, Humberto. Como se faz uma tese. 14ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1998.

GALLIANO, Guilherme A. O método científico: teoria e prática. São Paulo: Harbra, 1979.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projectos de pesquisa. 3º ed. São Paulo: Atlas, 1996.

Hipólito, João. Colette Campiche, Josette C. Hippolyte.: A comunidade como centro. Serviço de educação da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa 1992.

ISKANDAR, Jamil Ibrahim. Normas da ABNT comentadas para trabalhos científicos. Curitiba: Champagnat,2000.

LACATOS, Eva Maria. & MARCONE, Marina de Andrade. Metodologia Científica. 2º
ed. São Paulo: Atlas, 1991.

LEE, Raymond M.: Métodos não interferentes em pesquisa social. Trajectos, edições Gradiva, Lisboa, 2003

LESSAR-HERBERT, M. et al. Investigação Qualitativa: fundamentos e prácticas. Lisboa: Instituto Piaget.

MYNAIO, Maria Cecília de Souza. (Org.) Pesquisa social: teoria, método e criatividade.
Coleção tema sociais. 9º ed. Petrópolis: Vozes. 1998.

OLIVEIRA, Silvio Luiz. Tratado de metodologia científica: Projetos de pesquisas, TGI,
TCC, monografias, dissertações e teses. São Paulo: Pioneira, 1997.
QUIVY, Raymond.: Manual de Investigação em Ciências Sociais, Gradiva Publicações Lda, Lisboa, 1998
RUDIO, Franz Victor. Introdução ao projeto de pesquisa científica. Petrópolis: Vozes, 2000.

Anexos

No caso de possuirmos outro material relacionado, tal como resultados de um estudo piloto ou exemplares de instrumentos usados como questionários ou inventários, estes deve ser incluídos nesta secção final, tal como qualquer informação ou dados não referidos em detalhe ao longo do corpo principal do estudo mas que sirvam como referência útil para o leitor.

Glossário

Associações – Grupos sociais voluntariamente formados ou para onde se entra com um fim determinado. Nas sociedades primitivas elas equilibram, normalmente, grupos de indivíduos ligados uns aos outros por laços involuntários.

Configurações culturais – Os padrões em que parecem inserir-se as formas de vida obrigatórias e repetitivas de cada sociedade. Todas as partes de tais padrões estão cuidadosamente ligadas em conjunto.

Consciência social – O reconhecimento por parte de cada indivíduo dos valores culturais que existem na sua sociedade ou na sua cultura.

Dinâmica cultural – O estudo de forças interactuantes e em mutação, que por vezes estão em conflito e que um padrão de cultura tem de manter em equilíbrio em ordem a preservar o seu equilíbrio e a evitar que ele próprio se desintegre.

Estrutura social – Modos como os grupos e os indivíduos estão organizados e relacionados uns com os outros.

Interiorização de valores – O processo pelo qual se presume que se adquire os valores culturais de uma sociedade.

Observação participante – Uma técnica largamente utilizada pelos antropólogos culturais para a recolha de dados no campo. Em regra ela significa dque um observador masculino participa nas actividades dos homens que está a estudar e que um pesquisador de campo feminino partilha a vida das mulheres.

Papel – A forma específica de viver ou de se comportar que os membros de uma sociedade esperam ver em pessoas que detêm uma determinada posição social. Algumas vezes é encarada como constituindo o aspecto dinâmico de uma posição social.

Racismo – Doutrina que sustenta uma superioridade intrínseca de uma raça sobre outras.

As cidades do futuro

«A solução mais simples são os prédios de apartamentos.
Se as pessoas pretendem, a qualquer custo, viver em
cidades grandes, precisam aprender a morar umas em
cima das outras. Mas o povo não se acostuma facilmente
com esses prédios. Quase todos dirão que querem uma casa
só deles, e ao que tudo indica, uma casa, no meio de
um bloco compacto de casas enfileiradas ao longo de cem jardas,
parece-lhes mais só deles do que um apartamento suspenso no ar.»

George Orwell, the road to Wigan Pier (1937).



A nossa cultura demonstra uma grande ansiedade em relação ao futuro. Há mesmo quem afirme que a cidade é um utensílio eficaz que apenas tem servido aos grupos humanos dominantes para manterem o seu domínio. A significação, a utilização e própria estrutura da cidade só poderão modificar-se se a estrutura socioeconómica que lhe deu origem se transformar em primeiro lugar. Senão, os ajustamentos progressivos e as reformas hão-de sempre falhar na transformação das suas características contemporâneas.

A progressiva globalização das trocas e as modificações nas estruturas de produção deram, nos últimos vinte anos, uma grande importância às funções de decisão e ao novo sector terciário que se localiza nas maiores cidades, e sobretudo nos países desenvolvidos.

Essas novas metrópoles da globalização, organizam-se com cada vez mais frequência, em espaços mais amplos do que a cidade propriamente dita, e constituem regiões metropolitanas. Para Ascher, trata-se de progresso e marcha para as metapoles do futuro. Para outros, consiste em agravamento de certos problemas, fortemente evidenciados nos países do Sul.

No entanto, a gestão da convivência pública entre grupos sociais com situações económicas e relacionais muito desiguais, é central para a sustentabilidade das cidades do futuro. É que face às condições de reconhecida desigualdade no acesso aos bens urbanos disponíveis, o papel regulador estatal permite reequacionar o lugar das diferenças na vida das cidades “gigantes”. Sem ele, as dinâmicas bem conhecidas noutros continentes tomarão inevitavelmente conta dos nossos espaços públicos, da nossa vida colectiva, reduzindo ao ínfimo o sentido de liberdade que tanto enalteceu o sonho de metrópole que transportamos desde o final do século XIX.

Sonho ou terror policial, o futuro das cidades, sobretudo das grandes cidades, está em boa medida dependente da capacidade que os decisores tiverem para definir e aprovar políticas para as cidades e as suas populações, nas quais sejam necessariamente tomados em conta os custos económicos no imediato, mas também avaliados os custos sociais de longa duração. É pois necessário imaginar novas políticas que terão de ser ponderadas face a uma série de factores emergentes, dos quais se destaca a dinamização da mobilidade em todos os planos.

À semelhança do autor, partilho da opinião de que é evidente que as políticas pensadas para grupos sócio-económicos homogéneos são hoje pouco eficazes, suscitando custos excessivos e resultados constrangedores.

A constatação de que vivemos hoje em registos de mobilidade mais intensos, quer física, quer social e culturalmente, obriga a rever algumas certezas sobre as boas formas de agir nas políticas urbanas.

A cidade permanece um objecto polissémico, um objecto facetado do qual se podem fazer leituras diferentes e complementares umas das outras, consoante o aspecto que se decide privilegiar ou o tipo de método científico ao qual se pretende recorrer.

Para além disso, o próprio autor reconhece o atraso da solidariedade, a crise da citadinidade, da cidadania e das instituições da metapole, pondo em dúvida a capacidade de se ultrapassar estes mesmos problemas.

O Homem e o Espaço

Não se pode ter a certeza do grau de afectação do ambiente físico sobre o comportamento dos indivíduos. Na realidade, o ambiente físico não tem o efeito directo que os projectistas acreditam, sobretudo quando se sobrepõe ao ambiente social. Nesta obra, o autor admite inclusive uma certa falência do determinismo físico, que deixa a descoberto a ignorância pelos factores sociais, culturais e económicos que contribuem, em primeira-mão, para a vitalidade ou degradação do ambiente urbano. É comum a leitura da metrópole contemporânea como o locus da fragmentação, do desenraizamento e da polifonia esquizofrénica da malha urbana. No entanto, é igualmente comum o elogio da cidade, a exaltação de seus feitos, a leitura de suas virtudes.

De facto, a cidade exerce um fascínio sobre cientistas e artistas, além de despertar a paixão das pessoas que nela escolhem – ou são escolhidas por ela – para morar. Mas isto não elimina os problemas que a cidade acumula e reverte na forma de dramas e angústias. E na metrópole tudo o que é urbano e citadino é mais dramático, radicalizado, intenso.

Com efeito, já no início da década de 1990, os estudiosos do espaço urbano viram a necessidade de renovar as suas ferramentas analíticas para compreender o fenómeno metropolitano, que ganhava novos rumos e intensidade. De forma veemente, muitos autores reforçavam a necessidade de outras abordagens sobre o urbanismo, procurando saber como as cidades eram, e não tanto em como elas deveriam ser
[1].

Embora estas estratégias empíricas de análise não se baseiem nos mesmos pressupostos de pesquisa de Ascher, a sua constatação é a mesma: ouvir primeiro, para depois analisar. Descrever a realidade enquanto facto empírico e experienciado, e não explicar à luz de modelos teóricos ou dos processos históricos. É mais importante a experiência tal como ela se apresenta, e não o que possamos pensar, ler ou dizer acerca dela. O que interessa é a experiência vivida no mundo do dia-a-dia da pessoa. Isto significa que não se espera explicar a origem ou o fundamento dos processos ou dos fenómenos. Significa, antes, descrever os factos tais como são vividos, ou seja, tal como são concretamente revelados na experiência.

Neste sentido, o lugar apresenta-se como a categoria espacial mais sintonizada com esta perspectiva, por constituir-se na menor célula espacial, configurada na escala do corpo, quando tem um carácter individual, em torno das relações afectivas que essa pessoa mantém com o espaço. Assim, os homens dotam de «luminosidade» aqueles pontos do espaço onde atribuem significados especiais, relacionando-se com eles de maneira íntima, através de laços afectivos. Estes configuram-se primeiro com a casa, estendendo-se à medida que o homem amplia a sua experiência e se envolve com outros lugares.

A experiência dos lugares, no sentido fenomenológico, tem, portanto, a perspectiva da historicidade da pessoa, da sua vida e da sua memória. Não é estrita como a percepção, mas envolve a compreensão da experiência como um fenómeno completo, que se consubstancia no presente a partir de toda a historicidade e geograficidade vivida.

A perspectiva da experiência é, portanto, a memória vivida, o passado tornado presente, que na sua dinâmica, conforma o ser e o Eu. Envolve tanto a experiência corpórea sensitiva, quanto a experiência mediada, impossível de ser excluída, mesmo que fosse necessário fazê-lo. Mas como contextualizar a experiência no contexto da Metapolis?

De facto, penso que a individualização do indivíduo ocorrida na modernidade, e que traz como consequência a restrição do seu espaço existencial a uma experiência fragmentada da metrópole, torna impossível que alguém viva a cidade na sua totalidade. Mas será que poderíamos, a partir disso, minimizar a importância dos lugares? Ou a experiência deveria ser vista como vinculada mais ao sistema-mundo do que às relações interpessoais e às sensações corpóreas dos micro-espaços?

Qual é, de facto, a única geografia relevante para as cidades do futuro
[2]? Será que podemos afirmar que a metapole, com os seus imensos processos, minimizou a importância desta vinculação orgânica homem-meio? Será que a experiência mediada impede o homem de se orientar a partir do lugar, e nele centrar sua visão de mundo?

De facto, mesmo após a leitura da obra de Ascher, não temos a certeza de que a dialéctica local-global é a melhor maneira de expressar esta natureza da vida contemporânea. A realidade tal como é experienciada só pode ser classificada e separada através da actividade racional de quem reflecte sobre ela.

[1] Neste sentido, Jacobs propôs-se a estudar a metrópole por outra via: «a maneira de decifrar o que ocorre no comportamento aparentemente misterioso e indomável das cidades é, em minha opinião, observar mais de perto, com o mínimo de expectativa possível, as cenas e os acontecimentos mais comuns, tentar entender o que significam e ver se surgem explicações entre eles». (JACOBS, 2003, p.12-13)

[2] Para pensar a questão, vejamos uma explanação acerca da relação do Homem com o espaço, da década de 1970: «o Homem sempre teve necessidade de estruturar e identificar o seu meio circundante, e a habilidade de se locomover com um mínimo de certeza sempre esteve presente em todos os grupos humanos. Pode-se mesmo afirmar que reconhecer e padronizar as vizinhanças é uma necessidade básica, que tem suas raízes em um passado remoto e que é de relevância prática e emocional para o indivíduo isolado ou em grupo. Há uma interacção profunda entre observador e observado. A Natureza sugere contrastes e relações que assumem a função de referências, que em sua maioria são apelos às percepções visuais, tanto de cor, forma, luz como de movimento. Enquanto que o Homem adapta aos seus propósitos tudo o que percebe, isto é, selecciona, organiza, e principalmente atribui significado às percepções. Os diferentes ambientes resistem ou facilitam o processo de construção do relacionamento harmonioso entre o perceber e o percebido.» (OLIVEIRA, 1976, p.56)

1.3.06

Uma breve impressão da Lusitânia

Na visão de José Gil, os portugueses são um povo sem remédio, voltados para a sua própria não-inscrição na sociedade, derrotistas por natureza e pessimistas quanto baste.
Já Boaventura de Sousa Santos admite um certo optimismo trágico para o futuro dos portugueses, querendo com isto dizer que apesar de tudo aquilo que possa estar mal nos vários sectores da sociedade portuguesa, de alguma forma ainda reside na alma mater da nossa nação uma força anímica latente que poderá revolucionar este país.

Por sua vez, os partidos políticos portugueses, optam pelo populismo próprio de uma certa elite burguesa confortavelmente instalada no poder, tecendo leis e directrizes para um sistema que vive para eles, ao invés de servir o cidadão comum, sim, porque um político não é um cidadão comum, nem na lei, nem na bolsa, nem no espelho. São digamos, pessoas especiais por natureza, devido à sua vocação para a incapacidade de trabalhar.

Por último, os nossos intelectuais escolhem ou o silêncio, ou o olhar distanciado de quem vê a sociedade por fora, tecendo críticas esporádicas neste ou naquele suporte, não para melhorar a situação, mas para marcarem uma posição de destaque perante um determinado problema. Ao fim ao cabo, não passa de uma questão de afirmação pessoal.

A nossa juventude divide-se entre os que bebem e fumam, os que só fumam, os que só bebem, os obesos precoces, e as juventudes partidárias e associações juvenis de voluntários. Se os primeiros aspiram à embriaguez do poder que está colado nas bordas do tacho, os outros querem mudar o mundo. Em ambas as utopias, uma coisa é certa: a nossa juventude está louca.

Que futuro para Portugal?

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