P E R S P E C T I V A S

Para uma crítica do Conhecimento nas sociedades pós-modernas

30.1.06

A sociedade: patrimónios, comportamentos e identidades em constante mudança

«A diversidade social é cada vez mais complexa,
flutuante e plástica. Domina o sentimento de mudança,
os comportamentos individuais são cada vez menos
classificáveis nos grandes grupos de pertença e a sociedade
não é mais do que um conjunto de indivíduos.»

François Ascher


Correlativamente, troca, mobilidade, controlo, produtividade, eficácia económica e planificação são as palavras que talvez expressem de forma mais clara a emergência desta cidade amplamente urbanizada. Por outro lado, se a urbanização tem na sua essência a necessidade de interacção, as cidades afiguram-se dentro deste processo como uma espécie de «comutadores sociais».

Numa perspectiva mais pessimista, regista-se uma corrente que radica quer na sociologia, quer na arquitectura, que defende a (des) construção da cidade e a emergência de uma realidade só e eminentemente urbana
[1]. Ainda dentro desta linha, importará saber se a cidade conseguirá ser um território unificado e específico, ou se será somente um jogo combinado de territórios plurais, diferenciados e justapostos, não podendo, por isso, assumir uma unidade territorial.

O grande desafio que se coloca hoje à cidade – e particularmente a quem a gere – é o de ter a capacidade de controlar as tendências de uma cada vez maior segregação sócio-espacial, fazendo emergir uma cidade recortada, onde parece cada vez mais difícil recompor uma unidade urbana integrada.

Perante uma nova fase de crescimento metropolitano, em que a cidade-rede multipolar e policêntrica, tendencialmente se encontra inserida em sistemas urbanos macro-regionais, eixos continentais e fluxos globais, não é somente o futuro da cidade que se apresenta difícil de prever, é já a própria cidade contemporânea que se torna difícil de compreender, pela sua particularidade, complexidade e escala, que ultrapassa os próprios limites da legibilidade humana.

Todavia, estas imagens, que prefiguram o pesadelo do nosso futuro urbano, já se encontram materializadas nos limites e periferias de muitas das cidades europeias actuais. O caos urbano não é uma antevisão do futuro, é, pelo contrário, o presente progressivo da cidade desurbanizada.

Contudo, a cidade prevalece, apesar das dinâmicas destruturadoras, das lógicas do capitalismo avançado, da mobilidade, das telecomunicações dispersivas e da fragmentação urbanística e social. Se encontramos a cidade bem segura, tanto nos seus alicerces económicos seculares, como nos seus valores culturais e políticos, assistimos ao enfraquecimento da esfera pública na vida e espaço urbanos. Do Porto a Istambul, de Nápoles a Roterdão, ou de Lille a Varsóvia, encontramos, hoje, uma nova relação entre os habitantes e os espaços da cidade.

Numa Europa, em que os equipamentos lúdico-comerciais substituem progressivamente a rede de espaços públicos urbanos, em que se introduzem mecanismos privados na produção de espaços públicos e usos colectivos em espaços privados, verifica-se que já não é clara a fronteira entre os domínios públicos e privados das cidades. Identificamos na leitura das cidades europeias contemporâneas, a existência de um sentimento de crise que atravessa a vida pública, reflectida na crescente intensificação do uso e da importância dos equipamentos e estruturas privadas.

Como qualquer outro aspecto da cultura urbana, a fusão das esferas urbanas do público e do privado, reflecte profundos processos de mudança e antecipa o combate do próximo século entre a cidade pública e social e a cidade civilizada do lucro e da diversão. Contudo, serão estes os sinais aparentes de uma crise da cidade, desistindo do espaço público urbano em prol da colectivização do espaço privado?

[1] Dentro desta óptica podemos destacar a tese de Françoise Choay, que advoga o reino do urbano e a morte da cidade nos seguintes termos: «A cidade já não pode ser um objecto que justapõe um estilo novo ao passado. Ela não sobreviverá senão sob a forma de fragmentos, imersos na maré urbana, com faróis e bóias por inventar.» Outros autores reiteram este ponto de vista considerando que «a velha metrópole está fora de moda, é difícil de governar e é onerosa, já que os ‘efeitos perversos’ ultrapassaram há muito os ‘efeitos benéficos’.»

A Metapolização

«O inferno dos vivos não é algo que ainda virá a ser, se existe,
é o que já existe aqui, o inferno em que vivemos todos os dias,
que formamos por estarmos juntos. Existem duas maneiras de
escapar ao sofrimento desse inferno. A primeira é fácil para
muitas pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte integrante dele,
de tal modo que já não se consegue vê-lo. A segunda é arriscada
e exige uma vigilância e uma apreensão constantes: procurar e
aprender a reconhecer quem e o quê no meio do inferno, e
então faze-los resistir, dar-lhes espaço.»

Ítalo Calvino in Cidades Invisíveis.


Segundo Ascher, uma metapole é o conjunto de espaços em que a totalidade ou parte dos habitantes, das actividades económicas, ou dos territórios, está integrada no funcionamento quotidiano de uma metrópole. Mas como é que este conceito ajuda-nos a compreendermos de facto a vastidão de fenómenos presentes nas metapoles?

Com efeito, sentimo-nos atraídos pelos dados numéricos, que são muito mais preciso, firmes, e impressionantes que os componentes leves e subjectivos dos padrões e dos sentimentos. Os números da congestão do tráfego são mais importantes que as frustrações dos peões que atravessam a rua. Os requisitos em metros quadrados de um compartimento sobrepõem-se às características normalizadas do fácil relacionamento social. Os planificadores esforçam-se por aumentar a quantidade de espaço aberto e esquecem-se de controlar a sua qualidade. A quantidade de uma coisa é uma das suas características importantes, mas o teste fundamental é, como sabemos, a sua adequação comportamental aos indivíduos.

A super-articulação entre as escalas de poder, economia, política e cultura, e o peso do sistema mundial de produção e de consumo, dotaram as metrópoles de uma complexidade sem igual. E junto com ela, a complexificação dos seus problemas e dramas.

Este é um problema crónico da modernidade, que colocou o indivíduo numa solidão, condenando-o a viver em ilhas afectivas no grande arquipélago da sociedade de massas. Esta solidão da cidadania, onde o indivíduo é suprimido pelas forças colectivas como a cultura, as normas estatais e comportamentais, além de uma série de outras forças micro ou macro políticas que isolam e constrangem, é uma marca da própria modernidade. E de facto, o cidadão é órfão de direitos fundamentais quando faz parte de uma ordem social que o transformam num mero peão nas mãos de poderes arbitrários ou de forças colectivas que não respeitam o seu ser próprio, subjugando-o a projectos e interesses especiosamente apresentados como supra-individuais.

Nos países desenvolvidos, alguns descrevem uma nova revolução urbana que anuncia o fim da grande cidade da época industrial, e o nascimento das metapoles de amanhã, como advoga Ascher. A periurbanização substitui o crescimento denso e contínuo das metrópoles por uma extensão sobre territórios desconcentrados, descontínuos, heterogéneos e multipolarizados, sem limite preciso entre a cidade e o campo.

As inter-relações das unidades urbanas diferenciadas, implicam um acesso fácil aos meios de comunicação e de mobilidade que condicionam seu funcionamento: acesso às relações informatizadas pela posse dos instrumentos necessários; acesso aos centros de emprego através de deslocamentos alternados facilitados.

A integração no sistema é, portanto, condicionada por um certo padrão de vida e suscita a exclusão das populações pobres. À visão optimista de passagem para a metapole
[1], alguns podem contrapôr, mesmo nos países desenvolvidos, a formação de verdadeiros guetos no interior destas regiões metropolitanas, e o agravamento das segregações sócio-espaciais. Trata-se de um problema de primeira linha que se impõe àqueles que têm a obrigação de gerir a cidade. E ainda assim, o autor não consegue responder à grande questão que ele próprio coloca: até onde poderemos chegar no controlo da metapolização?

[1] A metapole, esse território vago e heterogéneo, não tem, portanto, limites precisos. Na Metapole, o citadino move-se, e tudo se move em seu redor.

21.1.06

A conservação biológica e a extinção das espécies

«Semelhantes e diferentes de nós ao mesmo tempo,
os animais são o único termo de comparação que
a natureza nos oferece para permitir que nos identifiquemos.»
F. Sigaut, 1994

«O homem ainda conserva na sua estrutura física o selo indelével da sua origem humilde.»
Charles Darwin, 1871

«O Homem é incomparavelmente mais rico quando considerado não como centro estático do mundo, como durante tanto tempo se admitiu, mas como eixo e flecha da Evolução.»
Teilhard de Chardin, 1925


«Portugal só será um país de primeira quando for um país ordenado
e bem regulamentado em tudo aquilo que tem a ver com o equilíbrio
entre o homem a natureza».
Durão Barroso, na sessão de apresentação do Programa Ambiental
"Finisterra - sobre a terra e sobre o mar", em Esposende (2003).



Segundo um estudo divulgado pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), divulgado em Antananarivo, Madagáscar, existem 25 espécies de primatas em risco de extinção nos próximos 100 anos. As principais causas apresentadas no estudo foram a desflorestação que por todo o mundo vai ocorrendo e a captura de algumas espécies para uso culinário ou na medicina tradicional. Em risco, encontrarmos, entre outros, lémures, chimpanzés, gorilas, orangotangos, macacos aranha marron, micos leão de cara preta e o macaco preto de peito amarelo, alguns com origem nas florestas do Brasil. A lista apresenta espécies existentes em África, na América do Sul e na Ásia.
A comunidade política internacional tomou consciência desde cedo da necessidade de conservação e protecção dos habitats e espécies mais ameaçadas. Prova disso são as convenções internacionais que surgiram ainda na década de 70:

a) Convenção sobre Zonas Húmidas de Importância Internacional (Convenção de Ramsar, 71)

A Convenção de Ramsar tem o objectivo de eliminar a progressiva invasão e perda de
zonas húmidas, áreas reguladoras dos regimes de água e habitats de flora e fauna características, especialmente de aves aquáticas – ecologicamente dependentes de zonas húmidas e que constituem um recurso internacional dado as suas migrações periódicas poderem atravessar fronteiras.
Ao aderir à Convenção, cada Parte terá que identificar pelo menos uma zona dentro do seu território, para constar da Lista de Zonas Húmidas de Importância Internacional (de seguida designada de Lista), de acordo com os requisitos estabelecidos pela própria Convenção, como as áreas de habitat de aves aquáticas. Qualquer Parte Contratante poderá adicionar à Lista outras zonas húmidas do seu território, alargar os limites ou, por motivo de interesse nacional urgente, anular ou reduzir os limites das zonas húmidas já incluídas na Lista (neste último caso deverá ser prevista uma compensação da perda de recursos da zona húmida).
As Partes Contratantes deverão, quando necessário, convocar conferências consultivas sobre a conservação de zonas húmidas e aves aquáticas, assim como elaborar e exercer os seus planos de modo a promover a conservação das zonas húmidas incluídas na Lista e a sua exploração racional.

b) Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e Flora Selvagem Ameaçadas de Extinção (Convenção CITES, 1973)

A Convenção CITES tem como objectivo regular a comercialização (exportação) de espécies ameaçadas de extinção e de outras que possam vir a ser ameaçadas de extinção como consequência dessa comercialização. As Partes deverão tomar medidas adequadas para garantir a aplicação das disposições da presente Convenção, sugerindo-se a designação, por estas, de portos de saída e de portos de entrada, onde os espécimes devem ser apresentados.
De acordo com este documento, a exportação de espécies só poderá ser feita através do cumprimento de determinados aspectos, nomeadamente a apresentação de uma licença de exportação, cujas especificações encontram-se em anexo da Convenção (anexo IV).
Actualmente a Convenção protege mais de 27.000 espécies de animais e plantas, todas elas espécies raras ameaçadas de extinção ou cujos níveis de Comércio Internacional podem comprometer a sua sobrevivência.

c) Convenção sobre a Conservação de Espécies Migratórias Selvagens (Convenção de Bona, 1979)

Face à importância das espécies migratórias, esta Convenção foi estabelecida com o intuito de eliminar ou minimizar as espécies migratórias cujo estado de conservação é desfavorável. As partes deverão tomar as medidas necessárias para a conservação das espécies e dos seus habitats.
A Convenção lista em anexo as espécies ameaçadas (Anexo I) e as espécies migratórias, cujo estado de conservação é desfavorável e cuja conservação e gestão devam ser objecto de acordos internacionais (Anexo II). Cada acordo deverá assegurar o restabelecimento ou a manutenção das espécies migratórias em causa num estado de conservação favorável.

d) Convenção relativa à conservação da vida selvagem e dos habitats naturais da Europa (Convenção de Berna, 1979)

A Convenção de Berna reconhece que a flora e fauna selvagens constituem um património natural essencial na manutenção dos equilíbrios biológicos. Esta Convenção visa criar um equilíbrio entre os interesses de conservação e os interesses económicos e sociais.
As Partes Contratantes tomarão as medidas necessárias à conservação de espécies da flora e fauna selvagens (principalmente as listadas nos anexos I e II da presente Convenção, respectivamente) e dos seus habitats naturais, nomeadamente daqueles cuja conservação exige a cooperação de diversos Estados. A Convenção dá especial atenção às espécies ameaçadas de extinção e vulneráveis, incluindo as espécies migradoras.
As partes deverão proibir, consoante as necessidades, a detenção ou a comercialização de espécies contempladas nesta Convenção e informar a Comissão Permanente (criada no âmbito desta Convenção, de forma a assegurar o seu cumprimento) das espécies que beneficiem de protecção total no próprio território e que não figurem nos anexos da Convenção.
As Partes Contratantes comprometem-se a cooperar e a encorajar a reintrodução de espécies indígenas da flora e fauna selvagens, sempre que tal medida possa contribuir para a conservação de uma espécie ameaçada de extinção, de acordo com estudos prévios realizados. Muitos outros instrumentos foram criados posteriormente, ainda no âmbito da preservação da biodiversidade, dos quais se apresentam, de seguida, os mais significativos.

e) Estratégia Mundial para a Conservação

Em 1980, foi criada, pela UICN (União Internacional para a Conservação da Natureza), a Estratégia Mundial para a Conservação, com vista a alertar a opinião pública mundial para o perigo das pressões exercidas sobre os sistemas biológicos mundiais e contribuindo para a elaboração de políticas sustentáveis como medidas para aliviar essas pressões. As três metas principais são:
1. Manter os processos ecológicos essenciais e os sistemas de suporte à vida;
2. Preservar a diversidade genética;
3. Assegurar a utilização sustentada de espécies e de ecossistemas.
f) Convenção sobre a Diversidade Biológica (CBD, 1992)

A redução de biodiversidade a nível internacional, a interdependência e as relações transfronteiriças estabelecidas entre diferentes espécies e ecossistemas motivaram a adopção da CBD. Esta Convenção reconhece a importância da diversidade biológica para a evolução e manutenção dos sistemas de suporte de vida no nosso planeta e do combate na origem das causas de redução ou perda dessa diversidade, como se constata dos seus objectivos fundamentais: a conservação da biodiversidade, a utilização sustentável do seus componentes e a partilha justa e equitativa dos benefícios resultantes da utilização dos recursos genéticos, incentivando-se o intercâmbio de informação entre os vários países e a transferência apropriada de tecnologias relevantes. Cada Parte Contratante deverá desenvolver, no âmbito do artigo 6º da Convenção, estratégias, planos e programas nacionais, que tenham como finalidade alcançar os objectivos da presente Convenção, ou adaptar para esse fim os já existentes.
Cada Parte Contratante deverá ainda estabelecer um sistema de áreas (protegidas ou não) onde tenham que ser tomadas medidas para a conservação da diversidade biológica, incluindo a sua monitorização e a criação de dispositivos nacionais de resposta a situações de emergência relativas a actos
antropogénicos ou naturais que aparentem graves perigos para a biodiversidade.
A responsabilidade dos Estados de assegurarem que as actividades sob sua jurisdição não prejudicam o ambiente de áreas situadas fora da sua jurisdição é reconhecida também na CBD, devendo estes realizar previamente avaliações de impacte ambiental dos projectos que possam vir a ter efeitos adversos sobre a biodiversidade, com vista a evitá-los ou reduzi-los e, quando apropriado, permitindo a participação do público.
A Convenção estabeleceu o “mecanismo centro de intercâmbio” (Clearing-House Mechanism), de forma a assegurar o acesso partilhado de todas as partes à informação e às tecnologias necessárias para preservar a biodiversidade. Este mecanismo surge assim como veículo principal para o intercâmbio internacional de informações e tecnologias sobre a biodiversidade.

g) Estratégia pan-europeia da Diversidade Biológica e Paisagística (1995)

Esta estratégia foi criada com o intuito de encorajar a conservação das espécies, dos ecossistemas e dos processos naturais, em complementaridade com a promoção do desenvolvimento sustentável e da co-responsabilização de todos os sectores pela conservação da natureza. A Estratégia estabelece um sistema internacional de cooperação de forma a consolidar programas existentes ao nível da conservação, permitindo um uso mais eficiente das políticas, iniciativas, mecanismos e informação já existentes. Não é objectivo desta estratégia introduzir nova legislação ou programas, mas sim o de reforçar a implementação das medidas existentes e de identificar acções adicionais a realizar nas duas próximas décadas. Além disso, promove a integração da diversidade biológica e paisagística nos sectores sociais e económicos e a implementação europeia da CBD.

h) Protocolo de Biossegurança de Cartagena (2000)

De acordo com o
princípio da precaução, o objectivo deste Protocolo é o de assegurar um nível adequado de protecção ao nível da transferência, manuseamento e uso de organismos geneticamente modificados (OGM) que possam ter efeitos adversos na conservação e uso sustentável da diversidade biológica, assim como em termos de saúde humana, sendo focados especialmente os movimentos transfronteiriços.
Este Protocolo não se aplica ao movimento transfronteiriço de OGM que constituam produtos farmacêuticos para o Homem abrangidos por outros acordos internacionais.
Em termos dos movimentos transfronteiriços de OGM, a Parte exportadora deverá notificar ou requerer que o exportador assegure previamente uma notificação à autoridade nacional competente da Parte importadora, devendo a Parte exportadora assegurar a veracidade da informação providenciada pelo exportador. A Parte importadora deverá informar o notificador se o movimento transfronteiriço se poderá realizar ou não.
A Parte que tome a decisão final sobre o uso doméstico de um OGM que poderá ser sujeito a movimentos transfronteiriços para uso directo ou para processamento, deverá informar as Partes através do “Biosafety Clearing House”(parte integrante do “Clearing House Mechanism”). Este mecanismo visa facilitar a troca de informação científica, ambiental, técnica e legal sobre OGM e ajudar as partes a implementar o Protocolo supracitado. Cada Parte deverá promover também a participação pública. Cada Parte Contratante pode, a qualquer instante, rever e alterar a decisão relativamente a quaisquer movimentos transfronteiriços intencionais.
As partes deverão estabelecer e manter mecanismos apropriados com vista a regular, gerir e controlar riscos identificados nas análises de risco dos possíveis efeitos adversos do uso, manuseamento e movimento transfronteiriço de OGM ao nível da conservação e uso sustentável da biodiversidade e da saúde pública. As Partes serão também responsáveis por notificar outras Partes de “largadas” que possam conduzir a movimentos transfronteiriços não intencionais com efeitos adversos sobre a biodiversidade. A nível comunitário, a UE desenvolveu várias directivas, com o intuito de cumprir Convenções Internacionais por si ratificadas. É o caso da Directiva Habitats e da Directiva Aves.
A Directiva n.º 92/43/CE, de 21 de Maio, ou Directiva Habitats, surgiu com o objectivo de favorecer a manutenção da biodiversidade através da conservação e preservação dos habitats naturais, da fauna e flora selvagens, no território europeu dos estados-membros (EM), tomando simultaneamente em consideração as exigências económicas, sociais e culturais. Esta directiva foi alterada pela Directiva n.º 97/62/CE, de 27 de Outubro. A Directiva Habitats cria uma rede ecológica europeia, a
Rede Natura 2000, visando assegurar a sobrevivência, a longo prazo, das espécies e habitats mais ameaçados da Europa. Esta rede deverá ser constituída por ZEC (Zonas Especiais de Conservação) e integrando ZPE (Zonas de Protecção Especial), estas últimas instauradas pela Directiva n.º 79/409/CEE, de 2 de Abril – Directiva Aves. Actualmente, a Directiva Habitats e a Rede Natura 2000 são reconhecidas como os principais instrumentos da UE para realizar o objectivo mundial e europeu de suster o declínio da biodiversidade até 2010.
No entanto, para um grande número de espécies, o simples estabelecimento de um sistema de áreas protegidas não é suficiente ou adequado, pelo que a Comunidade Europeia elaborou uma estratégia comunitária para a biodiversidade, com vista a antecipar, prevenir e atacar na fonte as causas da grande redução ou perda da biodiversidade –
Estratégia da Comunidade Europeia em matéria de Diversidade Biológica. Esta estratégia pretende assegurar o cumprimento da CBD, através da identificação de falhas e melhoria da política comunitária de conservação e da integração da biodiversidade nas diversas políticas comunitárias (como na agrícola, na das pescas e na do turismo) e nos planos e programas sectoriais e intersectoriais de cada um dos EM. A Estratégia incide sobre quatro temas: conservação e utilização sustentável da biodiversidade; partilha dos benefícios resultantes da utilização dos recursos genéticos; investigação, identificação, monitorização e intercâmbio de informações; educação, formação e sensibilização do público. A Estratégia articula-se com o 6º Programa Comunitário de Acção em matéria de Ambiente, que define, como uma das suas prioridades, a conservação da natureza e da biodiversidade, pilar ambiental da Estratégia Europeia de Desenvolvimento Sustentável.
Portugal, apesar da sua reduzida dimensão, possui 43% da fauna de vertebrados terrestres existentes na União Europeia, é o quarto país europeu com maior número de
endemismos vegetais e é o terceiro em espécies ameaçadas.
A Lei de Bases do Ambiente (LBA), Lei n.º 11/87, de 7 de Abril, aconselha a elaboração de legislação adequada à introdução de exemplares exóticos da flora e a adopção de medidas restritivas de controlo no âmbito da introdução de qualquer espécie animal selvagem. A LBA sugere ainda a elaboração de uma estratégia como instrumento da política do ambiente e do ordenamento do território, que pretende enquadrar as políticas globais do ambiente e promover a sua integração nas diferentes políticas sectoriais, em articulação com a estratégia europeia e mundial.
Nos últimos anos têm-se multiplicado as reuniões e estudos, com vista a atingir a meta de redução da perda de biodiversidade até 2010. Foi o caso da reunião internacional: "2010 – O Desafio da Biodiversidade Global", realizada em Londres em Maio de 2003, contando com cerca de 150 participantes, incluindo governos, entidades de investigação, comunidades indígenas, sectoriais e locais, ou da reunião entre os ministros do Ambiente da Europa e de vários países asiáticos, em Madrid em Janeiro de 2004. Na reunião de Madrid concordou-se em desenvolver áreas naturais protegidas, incluindo as marinhas. A rede de áreas protegidas terrestre deverá estar estabelecida em 2010 e a marinha em 2012. No entanto, os ambientalistas consideram que as propostas acordadas em Madrid não são suficientes – por exemplo, os países da União Europeia não se comprometeram de forma significativa a ajudar os países em desenvolvimento na criação de áreas protegidas.
Como notícia positiva, a BBC divulgou, em Janeiro de 2004, o resultado do último censo realizado à população de gorilas em três países da África Central (Ruanda, Uganda e República Democrática do Congo), evidenciando o crescimento do número destes animais em 17%, desde 1989, consequência dos programas de protecção lançados pelos parques nacionais destes três países. Mesmo assim, a BBC afirma que a população de gorilas ainda se encontra ameaçada, tendo o estudo identificado apenas 380 exemplares da espécie. Por sua vez, a população de tigres de Sunderbans (reserva natural no leste da Índia) é a mais estável do mundo, de acordo com os resultados do último censo realizado (Janeiro, 2004).
Em Janeiro de 2004, o Parlamento Europeu aprovou um relatório sobre a “crise da carne de animais selvagens”, especialmente face à ameaça que existe sobre os grandes símios, como o gorila ou o chimpanzé, da autoria de Proinsias de Rossa, eurodeputado irlandês. A carne destes animais, capturados intensivamente em locais como a bacia do Congo, tem sido transportada em quantidades massivas para venda na Europa.
Apesar da sobreexploração deste tipo de carne ocorrer um pouco por todo o mundo, o relatório concentra-se no que acontece em África, visto este problema ser aí mais significativo e melhor descrito pela literatura. O relatório solicita à Comissão Europeia que elabore uma Estratégia e Plano de Acção, a integrar no Plano de Acção da União Europeia para a Biodiversidade, de forma a reforçar as capacidades das autoridades responsáveis pela conservação das espécies e de aplicação de leis e medidas contra o tráfico ilegal, prevendo-se a atribuição de 10% dos fundos do Fundo Europeu do Desenvolvimento e do Regulamento ALA (Ásia e América Latina) para esses fins. O Parlamento defende também a aplicação de campanhas de informação e educação para que as comunidades locais possam tomar consciência do potencial económico da biodiversidade e da necessidade de preservar as espécies ameaçadas.
Em suma, quando exploramos desenfreadamente os recursos vivos, estamos a ameaçar a nossa própria sobrevivência. Apesar de se começar a definir uma consciência global sobre a importância da biodiversidade, acções concretas são necessárias e urgentes, de forma a legarmos um património biológico íntegro às gerações futuras, que têm o direito de usufruir das mesmas opções de desenvolvimento que as gerações actuais.

1.1.06

Uma breve reflexão sobre o virtual

Será que as sociedades estão já tão embrulhadas nas teias virtuais das redes cibernéticas que sufocam o planeta, que a Humanidade, seja lá o que isso for, já não consegue imaginar um mundo sem pessoas digitais?

De facto, há quem acredite que as inerentes vicissitudes utópicas e virtualidades místicas da rede de comunicações globais vão lançar as civilizações num período de prosperidade eterna e conhecimento infinitos.

No entanto, eu não acredito que a informação libertará a sociedade do futuro, como se fosse um imperativo inemputável da evolução da raça humana, que testemunha o seu fim ao ver a carne apodrecer com olhos enxutos, mas que consome vorazmente a simples ideia de imortalidade iluminada, ao digitalizar o corpo humano em códigos binários de chuva esverdeada.

O mundo não deixa de ser irónico...

Abandonamos a poesia de condensar a alma num só grito, para a passarmos a condensar num só impulso eléctrico.

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